Estudo aponta que burocracia trava comércio exterior

Estudo inédito realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) traça um retrato dramático da burocracia que recai sobre o comércio exterior brasileiro. As exportações brasileiras, apesar da informatização de parte dos processos, ainda são sujeitas a 46 procedimentos diferentes, administrados por 12 órgãos, que afetaram 23% das vendas ao exterior realizadas no ano passado. Nas importações, são 72 obrigações controladas por 16 órgãos do governo, com impacto sobre 59% das compras.

“É um levantamento sistematizado de um conjunto de custos e encargos que chamamos de invisíveis”, disse a gerente de Política Comercial da entidade, Constanza Negri. “Não que eles não sejam sentidos na pele das empresas, mas porque são de difícil acesso pela falta de transparência e de disponibilidade das informações.”

“Grande parte da falta de competitividade da indústria brasileira é provocada por esses custos”, afirmou o ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral. “O Brasil não conseguirá fazer uma abertura comercial sem resolver as ineficiências, que vão de logística inexistente a greves extorsivas (dos fiscais).”

A variedade de problemas é tanta que o estudo não conseguiu chegar a seu objetivo original: estimar o peso dessas obrigações sobre a economia brasileira. Em nove casos, os autores não conseguiram apurar valores de algumas taxas nem recorrendo à Lei de Acesso à Informação.

 

Custo invisível

A deficiência nas informações e a falta de previsibilidade, além de um aparente exagero nas exigências e da burocracia, são os problemas apontados por 114 empresas ouvidas pela CNI em estudo. Constanza destaca que o controle na importação e exportação de produtos por parte do governo é legítimo e necessário. “Mas questionamos se não há excessos.”

O estudo alerta ainda que o custo elevado de determinadas taxas pode ser até mesmo questionado na Organização Mundial do Comércio (OMC) como uma barreira ao comércio. Como algumas são fixadas em reais, e não como um porcentual do valor da mercadoria, há risco de serem desproporcionalmente caras.

As empresas questionam até hoje por que o governo elevou de R$ 30 para R$ 185 a taxa de uso do Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), onde são registradas as operações de exportação e importação. Questionada sobre o aumento ocorrido em 2011, a Receita Federal não deu posicionamento.

A taxa de R$ 88,17 cobrada pelo Banco do Brasil para analisar documentos necessários para a emissão de licenças para as operações comerciais foi discutida até no Tribunal de Contas da União (TCU). Relatório elaborado pelos técnicos da Corte aponta que, em 2010, o banco arrecadou R$ 30 milhões, mas os custos administrativos foram da ordem de R$ 11 milhões. Os acordos internacionais dizem que as taxas devem ter um valor proporcional ao serviço prestado.

Questionada, a instituição informou que não divulga receitas obtidas com tarifas específicas e que faz o serviço por delegação do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic). O Mdic informou que delegou serviços ao BB por sua capilaridade e que o TCU julgou não haver irregularidade na tarifa ou na transferência de atribuições.

Simplificação. A partir de 2 de julho, 100% das exportações brasileiras serão registradas no Portal Único do Comércio Exterior, promete o governo. Pelo que se observou nas mercadorias que já transitam por ele, a redução de tempo para preencher a papelada cai 40%, de uma média de 13 dias para 7.

A economia se dá por uma razão simples: o exportador só terá de dar uma vez as informações que hoje precisa ser repetidas para cada órgão diferente que atua na operação. A Declaração Única de Exportação substituirá três documentos e será integrada à nota fiscal eletrônica. Com isso, a quantidade de exportações prestadas cai 60%, disse o secretário de Comércio Exterior, Abrão Árabe Neto.

O portal já funciona para alguns produtos e, com isso, o Brasil ganhou dez posições no ranking do relatório Doing Business, do Banco Mundial, no que se refere à facilidade no comércio exterior. Ainda assim, o País está na posição 139 em uma lista de 190 países.

Para Constanza Negri, gerente de Política Comercial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), é fundamental o governo garantir recursos para seguir com a implantação do Portal Único, inclusive para as importações. A “janela única” para o comércio exterior é recomendada no Acordo de Facilitação de Comércio da Organização Mundial do Comércio (OMC), do qual o Brasil é signatário.

“A burocracia e a insegurança jurídica afetam todos os setores”, afirmou o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Valente Pimentel.

A expectativa do governo é iniciar o registro das importações no Portal Único em outubro. As normas para o funcionamento do serviço foram colocadas em audiência pública e mais de 2 mil contribuições recebidas.

Fonte:  Estadão